Parte três: Flor lilás


Quente noite fria de inverno
Quente noite fria de inverno
ou então grandimensa melancolia.
Bucólicas plantas de florintensas
no terraço nuas, eu vestida.
Pequenos curtos textos, contos curvos,
parcas contas do (f) orçamento, coisas.
Constatação de que não fiz nada
no espaço breve, semanticovento.

Melancólicas folhas no terraço palmas,
ares diversos pela alma adentro.
Vão fatos fardos de tantas ordens,
quiçá desordens, no mais, silêncio.
Quando lá fora o dia clama
e se faz nítido e necessário e clamagita
e é comedido, incerto, vário,
sou entretanto.

Mas, porém, contudo, todavia:
íntimo verbo, máximencanto,
o olho prefixo é sempre além.
E se hoje me faço desacalanto,
é que renasço fenixamém
e rio e abraço.

2006

O homem da chave

(Que tinha deixado a chave na porta e agora não podia entrar, a não ser que lhe abrissem a porta.)

2006


Consolação
Poesia das esquinas.
Curtextenso poema.
A menina dos olhos nina a menina em mim.
Pouca trégua nas minhas retinas, desmágoa.
Vastos campos de amenaurora.

Vê se não chora, chapéu de fita.
                                            O párarraio agita o vento.
                                            Não sou alegre e nem ensaio
tristeza eterna em meu pensamento.

2006

Consideração
me acho
de repente
absolutamente
reppetittiva

Janeiro de 2006

Lagoa
Beira do lago, beira da vida,
largorizonte de mágoas ligeiras
medidas na água de orvalho.
Raio de sol pranteando a vidraça.

Outubro de 2006

Do perdão
Noite anterior à lua, véspera quase lua:
primaverassuspenduradas nos galhos.
Vai-se a hora e eu quieta,
suspirandoenluada no orvalho.
Afeto despedaçado no palavrário
que não podia ter sido, e no entanto.
Saltimbancos das trilhas e chãos de cascalho.
Passemos ainda cantando.

Dezembro de 2006

Tentativa persistente e inverterada de compreender Descartes, seus ditos e não ditos

RES           EXTENSA
REX           ISTÊNCIA

Fevereiro de 2007

Um
(primeiro)
Tomar um anti-inflamatório
pra ver se passa
essa crise de escrever palavra.
Janeiro de 2007

Um
(segundo-a-Contra-Reforma-Ortográfica)

Tomar um anti- - - -inflamatório
prá ver se passa-essa
crise-discreverpalavra.

Março de 2012

Estética
- O que é poesia?

Você me pergunta,
sua intenção repleta de interrogações difusas.
Eu lhe respondo com meu silêncio que inunda –
O que é poesia?

2009

Sombras
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2009

Gramática arretada em prosa e verso
- foi simbora mais ele.
- falei com ele que eu ia.
- ele falou com ela que ficava.
- como foi que tu deixasse?
- eu num já falei que não?
- ele já foi tomado banho.
- ê, criatura...
- Ô, Daiane! Ô Weliton! Ô Deivison!

- muleque atentado!
- aquilo sim é uma pura arte.
- vô busca o rezistro e volto já.
- come um pão de mortandela.
- leva o tique refeição.

...e outras delícias do Brasil afora...

2010

Brumas
Ando triste feito palavra aprisionada,
sem contorno, sem linha, sem peso.
Dera fosse a brisa da lua.

2010


Previsão do tempo 1

. CHu
.              .
.ViM     .       .pON
.                  .                         ..To
.             .        .
.Zi.zO
.    .     .
.La    .
.        .           .

.dOs

2010

Previsão do tempo 2

I          IIIII

GA     FI        F         I          II

RONA       I          F         I           I

A       FI         I          III

FI      NA       N        I          F           I

NA      I         I          N        I            I

GA     FI       A         I          II

RO     NA      I         A         I            I

A        FI        F        I          F           I

I         IIIII


2010

Exercício número 1
Quando me texto,
às vezes
acho-me patética.
Velhos escudos,
insípidos dissabores.
2011

Exercício número 2
análise sintática
complexa dialética
proposta analítica
relógio analógico
teatro do absurdo
2011

Exercício número 3
análise sintática
complexo dialética
semântica alfabética

romanticoanalítica
relógio analógico
vontade paraplégica.

Ele seguia jovial sob a garoa colorida, guarda-chuva vermelho de bolinhas, camisa listrada, bermuda xadrez.
2011

A festa
Flores faixas coloridas
numa rua singela oculta no barulho
dos papeis de seda.

Poema de estrada,
onde tudo se acaba e refloresce.

Julho de 2011

Ideias
Sobre o que escreveria?
Sobre um conjunto de flores tingindo o detrás-portão?
O tapete azul de operários enformigando tijolos?
Ou aquelas mulheres riscando com o fumo uma estranha partitura no espaço?
Era nada, nada... não apreendia ideia nenhuma, e o papel branco branco.
As letras se movimentavam de um lado para o outro, balanços monótonos e enovelados.
A tarde virava noite. O sol, estrelas.
O que seria agora, com estas novas configurações mundiais
– se perguntava?
E, no fim de contas, o que adiantava... se... enfim.
As folhas da samambaia espiavam verdes da janela aberta podia-se ouvir um raro pássaro.
Onde estariam aqueles pardais de uns poucos anos?
E o papel, branco branco .

Que coisa, que coisa!!!

Agosto de 2011


07 de junho

a vida corria leve as manhãs embandeiravam grandes desejos

pensou em deixar o país
num segundo e passou
vida breve um sopro sonho se viu por baixo da neblina londres talvez argentina
enquanto engoliu a primeira garfada dentes no restaurante parou um carro de boinas

cinzas

desceu o almoço engasgado sem cor olhou o céu
limpo azul total de sol onde estavam os amigos?
claro
como espelho

se viu

frança angola nordeste tailândia acre sudão

na calçada
uma flor linda delicada lilás e um curumim

pleno coração via lacteando
grande árvore de raiz
profunda

Junho de 2014

Exercício literário em tempos noturnos
(sobre paredes cinzas entre as flores)

Tudo que arde, cega.
Tudo que nega, noite.
Tudo que novo, claro.
Tudo que braço, forte.
Tudo que mata, cinza.
O que segura, enlaça.
Porém.
O que sufoca, inspira.
O que prender, liberta.
O que viver, caminha.
Tudo o que jovem, lira.
Tudo que pensa, alerta.
junho de 2014


Mover
entre sujeito e objeto
vão múltiplos ditos
vão casos claros
vãos carros de boi
passando
em frente em vão
cinzentos e verdes em vão.
Eu não.
Um porto entre o alheio
e o meu coração divaga.
Junho de 2014

NOITE
Um minuto de lua para os homens com e sem pão. Pequeno milagre urbano – na lua, os mais diferentes sonhos de amor e liberdade.
Maio de 2014

SEM TITULO
Basta um raio de sol para que se descortine o universo.
Infinitas galáxias de tinta,
Sem mais.
Maio de 2014

Exercício literário 1
popblack livro jogo buster estudante salescura bandido bom é bandido morto festa pop chic livro chile jogo estudante caixa preta classe a classe b zelar pela segurança classe c classe pró e classe anti festa muda muda a festa neruda comissão nacional de segurança amor o que faz você feliz seguindo os jornais catarse turba cega catarse salescura off-line
Junho de 2014

Prédio
Ele - olhava o alto para sentir o íntimo das janelas do novo prédio. O que via eram potências construídas umas por cima das outras, entijoladas e mais ainda, entijoladas.
Ela - olhava o mesmo íntimo. Viu um velho branco a contar os carros. E observou como nele o tempo passava com nobreza.
Ele olhava o alto para aproximar dos pensamentos cada viga que sustentava o novo prédio. O que via eram vigas encimadas de vigas.
Ela olhava o mesmo alto. Viu um vaso de flores miúdas e um jardim lilás. Arriscou: se voassem as flores despetalassem por toda a cidade, haveria mais cor e alguém seria feliz por isso.
Ele olhava o alto para se emaranhar no primor gelado de cada um dos pontos de cimento, como era lindo o novo prédio. Cimento sobre cimento, branco de gelo puro.
Ela olhava o mesmo ponto.  Viu que a cobertura terminava no azul e sobre a parede laranja subia um pequeno inseto teimoso. E viu que no jardim do quintal ao lado estava aberta uma flor vermelha. Perguntou: será que a noite cai?
Julho de 2014
Palavras
Vi hoje olhos de chumbo.
Vi por detrás da roupa cinza bem passada uma interrogação insatisfeita.
Penetrei sem rodeios e direta a profundeza dos olhos duros e vi incerteza.
Era manhã.
Busquei reter todo céu que pudesse para levar comigo o azul nos pulmões e na alma.
Vi hoje cedo olhos de chumbo.
Que até a tarde cresceram e se multiplicaram.
Verdes, cinzas, cinzas e verdes.
Fileiras escuras como um dominó.
Quis perguntar se eles também sentiam tremer o chão do país.
Se quando respiravam na rua, sentiam falta de ar.
Quis perguntar se eles tinham filhos.
Ou sonhavam ter.
Ou sonhavam.
Se dormiam bem à noite.
Se amavam.
Se também perderam amigos.
O mesmo medo.
O mesmo desconhecido.
O mesmo não saber.
Mas duro.
Caminhamos na direção contrária.
Frente a frente.
A parede cinza se aproximando, cruzando meu ar, atravessando minha alma, gelando o estômago, e finalmente seguindo reto.
Reto.
Reto.
Reto.
Reto.
Sempre em frente
e em linha reta.

O dia estava muito claro.
Era preciso cantar.
E amar.
Logo.

Junho de 2014











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