sábado, 22 de janeiro de 2022

 

Quinze para hora e o ônibus ainda não chegava hora nenhuma. Desertando, ela mirava o sol a pino, sacolas e bolsas atarefadas de afazeres. Entre os lampejos amarelos, imagens do tempo de menina quando não trabalhava nas casas. Quando no máximo o que tinha era bonecas de pano com olhos de botão e vestidos amarelo-vermelhos, potes encimados de sementes, alguns contados papeis, e ela rodopiava girando pelos quintais, poeiras de terra voavam sem-fim. Vem comer! Ela corria, mais as molecadas inúmeras, as bonecas de pano, os olhos de botão miravam as nuvens. Depois, as tardes infinitas, infinitíssimas... E hoje ela aqui. No atualmente. Dava a hora e nada dele vir. Onde andaria? Com seus longos cabelos compridos até o fundo do mar?

Não estava ruim na casa, não. Os povos eram bons e gentis. Havia comida, podia-se dormir com a tranquilidade das frestas das janelas, podia-se esticar os braços entre lacunas de histórias que ouvia durante o dia na sala, na cozinha, no quarto das crianças, no terraço. Faltava-lhe quase nada, a não ser um ponto de interrogação que lhe insistia na boca do estômago – desse, que tinha desde menina. Quando se cresce interrogada, toda estrada parece curva.

01/2022  

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